Alguém teve penfriends?

Quem é que teve amigos por correspondência que levante a mão no ar! Os menores de… vá, 25 anos, devem estar de olhos esbugalhados. Amigos de quê? Sim, é isso mesmo que leste. Antes dos computadores, da internet, dos telemóveis e do facebook, trocar cartas era a maneira mais baril de partilhar ideias, sentimentos, fotografias, paixões, coleções, e tudo o mais. Cada um terá a sua história. A minha começa com a publicação de uma fotografia das minhas fuças numa fanzine de uma banda holandesa dos anos 1990. Nem vou dizer qual é para evitar vómitos desnecessários. Apenas digo que era holandesa, um duo, cantavam pouco, dançavam mal e a música saía sobretudo de sintetizadores. É preciso dizer mais?

Eu era um adolescente a viver no meio do campo e com uma sede de partilhar músicas, emoções e novas amizades. Ao lado da imagem da minha cara estampada no papel de revista a cores estava uma frase minha e a respetiva morada. E foi assim que passei a ter penfriends (=amigos da caneta/amigos por correspondência). Nas semanas seguintes, chegaram dezenas de missivas, cada uma mais apaixonada que a outra. Recebia e trocava pósteres, cassetes, postais de cada país e, claro, longos textos, escritos à manápula, onde se dedilhavam as peripécias das nossas vidas. Era uma autêntica rede social, muito, mas muito antes do Zuckerberg criar a sua. Ele, como se vê, nada inventou.

Tive amigos de Taiwan, da Holanda, da França, do Reino Unido, da Espanha, dos EUA, de Portugal e até da África do Sul. Eles elas faziam perguntas e eu respondia com outras questões. Falávamos sobre tudo e eramos bons amigos. Acreditávamos que o mundo iria ser assim para sempre: simples, alegre, divertido.

Volta e meia sorrio quando me deparo com a caixa cheia de papel amarelecido com o tempo. E hoje como estou mais saudosista, tive que partilhar algumas das memórias que acumulei durante aqueles anos. Elas ainda ali estão no baú, guardadas para todo o sempre. Um registo da minha vida aos 14, 15 e 16 anos. Uma prova da minha infantilidade na idade certa, no momento ideal. Escusado será dizer que brota toda uma emoção em mim quando revejo algumas destas cartas. “Hiya, Thx 4 your really gr8 (coração)ly letter”, escreveu-me a Jenny, da França; “Today I have seen the tour de France. I don’t think it was spetacular because de ciclists were only 40 km/h. I think Chirac is a big asshole!”, confidenciou-me a Marleen, da Holanda. “Do you have any photo of Mariah Carey? Can you send one me next time?”, pediu-me o Arturo, da Espanha. “I want to say that you are one of the most important friends in my life. Friends forever right?”, prometeu-me o Peter, da Noruega. Do Peter nada sei e há gente que tenho que fazer um esforço para me recordar quem são. No meio desta mole de bilhetes, muitos estão ilustrados com toda uma parafernália de símbolos e frases típicas de jovens imberbes: corações; cruzes riscadas com um risco por cima; arco-íris; e por aí fora. E também há as cartas dos meus primeiros amores, a prometer amor eterno, com poemas lindos, frases cheias de certezas.

Os envelopes que guardo com mais carinho vieram do Gana. Ainda hoje ninguém me tira que a Lily era uma rapariga à procura de marido na Europa. Em envelopes A4 almofadados remeteu para a minha humilde morada longos textos sobre o seu país, a sua vida, fotos constrangedoras suas, guias turísticos e até peças de roupa caraterísticas do seu povo. Um dia prometo vestir-me com todas elas. No próximo Carnaval, talvez. Até lá, ficam estas imagens e uma ideia que me varreu a cachimónia assim de repente: que tal escreverem-me umas cartas? Em memória dos velhos tempos? Estou a falar a sério! Peguem numa caneta, folha e desabafem sobre as vossas vidas, os vossos problemas, amigos, familiares. Pormenores que marquem pela diferença. Depois, enviem tudo para a minha morada. Eu prometo fazê-lo de volta. Juro! A sério! Vai saber bem, em vez de olhar para um ecrã de computador, meter tudo no papel, tal como antigamente! Pode ser?

Rua Dr Manuel Branco, 30

2055-388

Vale de Santarém

Portugal

 

Who had pen pals raise their hands! Children under, humm… 25, must be bulging. Pen what? Yes, that's right. Before computers, the internet, mobile phones and facebook, exchanging letters was the cool way to share ideas, feelings, pictures, passions, collections, and everything else. Each will have their own story. Mine begins with the publication of a photograph of my face in a fanzine of a Dutch band from the 1990s. I will not even say which one, to avoid unnecessary vomiting. I just say they were Dutch, a duo, they sang little, they danced badly and the music came out especially from synthesizers. Need I say more?
I was a teenager living in the middle of the countryside and with a thirst to share music, excitement and new friends. On the side of the image printed on magazine was a sentence of mine and respective address. And there you have: how I discovered the world of penfriends or pen pals. In the following weeks, I received dozens of letters, each more passionate than the previous one. We exchanged posters, cassettes, cards of each country and, of course, long texts, written by hand where we told our daily adventures. It was a real social network, much, much before facebook. As it turns out, Zuckerberg invented nothing.
I had friends from Taiwan, the Netherlands, France, UK, Spain, the USA, Portugal and even South Africa. They asked questions and I answered with other questions. We talked about everything and we were good friends. We believed that the world would be like that forever: simple, cheerful, fun.
Today, of course, I smile when I find myself, now and again, with that box full of yellowed paper with time in my hands. And as I am more nostalgic today, I could not help but share some of the memories that I have accumulated during those years. They are still there in the card box, saved forever. A record of my life at 14, 15 and 16 years old. A proof of my childishness at the right age at the right time. Needless to say, all this springs all an emotion in me: "Hiya, Thx 4 your really gr8 (Heart)ly letter", wrote Jenny, from France; "Today I have seen the Tour de France. I do not think it was spectacular because of ciclists were only 30 m/h. I think Chirac is a big asshole!", confided to me Marleen, from the Netherlands; "Do you have any Mariah Carey photo? Can you send one me next time?", asked me Arturo, from Spain; "I want to say that you are one of the most important friends in my life. Friends forever right?", promised me Peter, from Norway.

I do not know where Peter is today and there are a lot of people whom I forgot and I need to make an effort to remind me who they were. In the midst of these pieces of paper, many are illustrated with an whole paraphernalia of symbols and phrases typical of young people still beardless: hearts; crosses scratched with a risk above; rainbow; stars; and so on. Then there are the letters of my first loves, who promise me eternal love, with beautiful poems, full of certainties.
One of the pen friends I keep more affection from came from Ghana. Even today nobody can change my mind that Lily was a girl looking for a husband in Europe. In big padded envelopes she sent to my humble abode long texts about her country, her life, with embarrassing photos, tour guides and even clothes from her tribes. One day, I promise, I’ll dress with all of them. Next Mardi Grass, maybe. Until then, see these images and how about start to write me some letters? It’s an idead I’m having right now. What do you think? In memory of the good old days? I'm serious! Grab a pen, paper and share your feelings about your life, your problems, friends, family. Details that mark the difference in you. Then send it to my address. I promise to write back. I swear! Seriously! It will feel great, instead of looking at a computer screen, putting everything on paper, like before this crazy era! Are you ready? Go!

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